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Punições: quando a solução vira problema

O castigo é uma das ferramentas educativas mais utilizadas tanto na família como na escola. As punições costumam ser vistas como uma maneira rápida de corrigir o comportamento. No entanto, Por trás desta aparente solução reside um problema mais profundo: as punições não promovem aprendizagem, compreensão ou conexão emocional. Em vez de resolver conflitos, podem criar ressentimento, medo e desconexão entre as pessoas.

A controvérsia da punição

Quando punimos, enviamos ao punido a mensagem de que o erro é inaceitável, ao invés de vê-lo como uma oportunidade de crescer e compreender as consequências de seus atos. Na maioria das vezes, a punição aborda apenas o sintoma do problema, não a sua raiz. Assim, quem é punido aprende a evitar a punição, mas não necessariamente a mudar sua forma de pensar ou agir. Neste ponto é preciso dizer que o erro também pode partir do educador de adultos.

Num mundo onde buscamos relações mais autênticas e harmoniosas, talvez seja hora de repensar algumas ferramentas educativas. O que aconteceria se em vez de punir, focássemos no diálogo, na conexão com valores e na construção conjunta de uma solução? Talvez descobríssemos que a verdadeira mudança não vem do medo, mas da compreensão e da empatia. Isto requer vontade e visão de longo prazo.

O debate sobre o uso da pena como instrumento disciplinar está presente há décadas no campo da psicologia e da educação. Enquanto algumas correntes tradicionais defendem a punição como forma de corrigir comportamentos indesejados, outras, como a parentalidade positiva e a parentalidade consciente, propõem alternativas baseadas no respeito mútuo, na empatia e no desenvolvimento emocional de crianças e adolescentes.

Do meu ponto de vista, o verdadeiro problema reside no facto de muitos adultos partirem do paradigma de que “quem tem o poder também tem o conhecimento”. Contudo, nada poderia estar mais longe da verdade quando se trata da educação da infância e da adolescência. Esta abordagem hierárquica não é apenas limitante, mas também impede a ligação genuína e a aprendizagem mútua.

O novo paradigma educacional nos ensina que, ao educar, tanto o educador quanto o aluno – ou pai e filho – aprendem um com o outro. Não se trata mais de impor a partir da autoridade, mas sim de construir juntos um processo em que ambos se transformem e cresçam.

Quando os adultos aceitam que podemos aprender com aqueles que educamos, deixamos de lado o controle rígido e abrimos espaço para o respeito, a empatia e a colaboração. Educar não é apenas ensinar, é ouvir, orientar e deixar-nos influenciar positivamente por quem acompanhamos no seu desenvolvimento. Esta abordagem não enfraquece a nossa autoridade, mas antes humaniza-a e torna-a mais eficaz. Porque no ato de educar não treinamos apenas os outros: treinamos também a nós mesmos.

O impacto dos castigos físicos e psicológicos

Como já mencionei, o castigo tem sido uma ferramenta amplamente utilizada na educação e criação das crianças. No entanto, numerosos estudos demonstraram que esta abordagem pode ter consequências negativas tanto a curto como a longo prazo.

Quando falo em castigo físico também quero dizer “uma bofetada ou tapa na bunda na hora certa”, tão consagrada em muitas culturas do planeta. Nas palavras do psicólogo infantil e psicanalista Bruno Bettelheim, “a punição pode alcançar a obediência momentânea, mas muitas vezes ao preço de suprimir o desenvolvimento da autodisciplina e da compreensão emocional nas crianças”.

Por sua vez, e graças às suas pesquisas sobre a infância, Alice Miller, psicóloga conhecida por seu trabalho sobre o abuso infantil, afirma que a violência exercida sobre as crianças leva à violência global que reina em todo o mundo, especialmente se Ele começar a bater e punir crianças nos primeiros anos de vida, precisamente no momento em que seus cérebros estão sendo construídos. Mesmo que as consequências escandalosas sejam evidentes, a sociedade não as percebe e muito menos as leva em conta.

Agora, a situação é fácil de entender: Os rapazes e as raparigas não têm o direito de se defenderem da violência dos pais e são obrigados a suprimir e reprimir as reacções naturais à agressão dos pais, como a raiva e a angústia. Só quando adultos poderão descarregar essas fortes emoções nos seus próprios filhos, parceiros ou, em certos casos, em nações inteiras.

Por que as punições não funcionam?

Algumas das razões mais relevantes pelas quais as punições não são eficazes incluem:

  • Aprenda com o medo: A punição geralmente se baseia em não fazer algo por medo das consequências, o que pode levar a criança a modificar seu comportamento para evitar ser punida, mas não porque entenda o impacto de suas ações. Isto pode limitar o desenvolvimento da auto-regulação e da tomada de decisão autónoma.
  • Ressentimento versus reflexão: As punições podem gerar sentimentos de ressentimento em relação aos pais ou figuras de autoridade, prejudicando o vínculo emocional e dificultando a comunicação futura. Em vez disso, uma boa conversa pode ser uma boa oportunidade para promover laços emocionais.
  • Consequências como culpa e vergonha: A punição pode fazer com que a criança internalize mensagens negativas sobre si mesma, associando sua identidade ao erro cometido. Isso pode afetar sua autoestima e sua capacidade de administrar as emoções de maneira saudável.
  • Gestão de conflitos ineficiente: Sem uma conversa esclarecedora e empática por parte da compaixão do educador, é provável que os mesmos comportamentos se repitam porque não sabem agir de forma diferente.
  • Comportamentos rebeldes ou evitativos: Sentindo-se controladas ou ameaçadas, muitas crianças respondem com um comportamento desafiador ou tentam esconder as suas ações em vez de assumirem a responsabilidade por elas. Isso pode reforçar a dinâmica negativa no lar.
  • Falta de confiança e conexão: Como apontou Bettelheim, a punição pode enfraquecer a confiança e a conexão emocional entre pais, mães e filhos. Um relacionamento baseado no medo ou no controle é menos eficaz na construção de um ambiente de aprendizagem e apoio.

Parentalidade positiva: priorizando comunicação, respeito e empatia

A parentalidade positiva é uma abordagem educacional que prioriza o respeito, a empatia e a comunicação eficaz. Este modelo centra-se no fortalecimento do vínculo afetivo entre a família e na promoção da autorregulação e autonomia dos jovens. Em vez de recorrer à punição, a parentalidade positiva concentra-se em:

  • Estabeleça limites claros e respeitosos: As crianças precisam de compreender as regras e as consequências das suas ações, mas estas devem ser apresentadas de uma forma construtiva.
  • Reforçar valores: Ensine as crianças a refletir sobre como suas ações impactam os outros e o meio ambiente.
  • Incentive a comunicação: Crie espaços onde as crianças se sintam confortáveis ​​para expressar as suas emoções e preocupações.
  • Liderar pelo exemplo: Pais, mães e cuidadores são os principais modelos para seus filhos, por isso devem agir de forma coerente com os valores que desejam transmitir.

Parentalidade positiva na prática

Implementar uma parentalidade positiva não significa evitar conflitos ou parar de estabelecer regras. Trata-se de abordar as dificuldades a partir de uma posição de compreensão e orientação, em vez de reação e punição. Aqui estão alguns exemplos de como aplicar essa abordagem em situações cotidianas:

  • Quando seu filho ou filha quebra uma regra: Em vez de “Você está de castigo por uma semana inteira”, você pode dizer: “Você pode me explicar o que aconteceu?” Como você acha que podemos resolver isso juntos?”
  • Quando há mau comportamento repetido: Em vez de “Se você fizer isso de novo, você ficará sem…”, você pode dizer: “Como você se sente quando age assim? Vamos conversar sobre o que você poderia fazer de diferente na próxima vez.”
  • Quando você precisa definir um limite: Em vez de: “Porque eu disse e pronto”, você pode dizer: “Vamos ver o que você acha do que eu penso. Como você vê isso?

Compaixão: uma palavra mágica na parentalidade

Há quase 18 anos chegou às minhas mãos “Não Existem Pais Perfeitos”, um livro maravilhoso do psicólogo infantil e psicanalista Bruno Bettelheim, recomendado pela minha grande amiga, a psicóloga Eva Aguilar, quando meus filhos gêmeos tinham apenas 2 meses de idade. Hoje sinto que a leitura dele deu um “clique” na forma como abordo a educação e a relação com meus filhos. Estou-vos profundamente grato por esta recomendação que me inspirou, e continua a ser, para acompanhar mães, pais e educadores na sua tarefa de caminhar juntos.

A palavra mágica é “Compaixão”. Uma compaixão bem compreendida na educação da infância e do adolescente é aquela que nos ajuda a compreender suas emoções, aprender juntos com os erros (deles e nossos) e enfrentar os problemas. A verdadeira compaixão na parentalidade envolve estar presente para orientar as crianças nos seus momentos difíceis, mas também permitir-lhes aprender com as consequências naturais das suas ações, para que cresçam na sua capacidade de autorregulação e responsabilidade.


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